antes era assim…

4 01 2008

“Da censura «a priori» para a censura «a posteriori»?”   

 No regime anterior, o Expresso foi, como se sabe, bastante perseguido. Tivemos diversas denúncias da Direcção-Geral da Informação à Polícia Judiciária, interrogatórios vários, um julgamento. Tivemos pressões de outro género, como inspecções de trabalho incompreensíveis. Tivemos advertências, ameaças, zangas.   

  Para além dos «castigos» frequentes, dos cortes de censura (agravados e complicados pela obrigatoriedade de envio de todas as provas e por dois longos períodos de envio de provas de página) nunca sofremos, no entanto, qualquer sanção. O único julgamento a que conduziram as variadas tentativas de incriminação do poder então constituído terminou com a absolvição do redactor acusado, bem como do chefe de redacção e do director.  

  A multa de 25 contos, que a nova Comissão «ad hoc» para o controle da informação nos aplicou na passada segunda-feira, é, portanto, a primeira sanção que sofremos. O fundamento genérico apresentado é a publicação de notícia falsa. Depois de analisada a notícia – referente à passagem a reserva obrigatória de 105 oficiais da Armada – verificou-se que, em 299 linhas do respectivo texto, nos é apontada uma incorrecção (falta apurar se se trata efectivamente de uma incorrecção) numa parte que ocupa 3 linhas.   

 A palavra falsidade, quando utilizada contra alguém, tem significado ofensivo e pressupõe que alguém agiu com intenção de, usando de falsidade lesar outrem. O Expresso não agiu com essa intenção. Por isso – e por não aceitar os termos e a existência de sanção aplicada – não se conforma e vai recorrer para os tribunais.

(…)    Se determinado facto ou situação não podem ser relatados e interpretados em toda a sua extensão e com todas as consequências, não há liberdade de Imprensa. Se se recriam tabus consoante as conveniências de alguns sectores, não há liberdade de Imprensa. Se se recorre ao Programa do MFA para limitar discricionariamente o direito de expressão nele consagrado, não há liberdade de Imprensa. Se se criam critérios políticos de legalidade não comprovada (e além do mais desconhecida de quem lhes sofre as consequências) para conduzir uma única politica informativa, não há liberdade de Imprensa.  

  E este é o dilema que se torna necessário solucionar em Portugal, no tempo actual. Qual a opinião que prevalece: a da quem faz os jornais ou a de quem os julga e detém poderes para os punir?    

 Durante anos vivemos neste País, submetidos a tutela paternalista da censura prévia. O 25 de Abril veio acabar com o atestado de irresponsabilidade que, entre outras coisas, ela representava. 

   Fartámo-nos de ser chamados irresponsáveis, sensacionalistas, divisionistas, ignorantes, etc. Demonstrámos que não o éramos, quando nos deram a oportunidade de o fazer. A liberdade trouxe a responsabilidade e com ela sabemos viver e trabalhar. 

   A multa aplicada ao Expresso parece, pois, fazer crer que a censura «a priori» se quer passar para a censura «a posteriori» – o que não desejamos nem aceitamos.    

Seria uma falsificação do Programa do MFA – o que não pretendemos nem admitimos (e no que não acreditamos). “

Editorial do jornal Expresso de dia 21 de Setembro de 1974


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